sexta-feira, 30 de outubro de 2009

Vamos contar espingardas/manifestantes como deve ser!

Citações.

«As notícias chegam de Espanha, de uma manifestação (por acaso de direita, mas com a esquerda seria o mesmo) contra o aborto. Estimaram os organizadores: 2 milhões. A Comunidad de Madrid (do PP, próxima dos organizadores): 1,2 milhões. A polícia: 250 mil. Extraordinária diferença! Mas ainda não viram nada. A empresa Lynce, especialista do assunto, pôs um zepelim no ar, com quatro câmaras de alta resolução e dois vídeos de alta definição. E não estimaram, contaram: 55 316 cabeças! A ciência lá nos deu cabo de mais uma ilusão.»

Ferreira Fernandes, DN, 29.10.09


Ah se a moda pega, se um olho de Lynce começa a contar manifestantes por cá. Lembram-se das manifestações contra a União Europeia, no dia da assinatura do Tratado de Lisboa, que congregaram 200 mil pessoas em Lisboa e 100 mil no Porto? Ou dos ajuntamentos patrióticos de professores contra os propósitos fascistas de sujeitarem as progressões na carreira a avaliações de desempenho? Pois são sempre 200 mil em Lisboa e 100 mil no Porto! E os jornais confirmam.


Nada de extraordinário, já era assim no PREC. Estive a reler há dias Álvaro Cunhal, "A Revolução Portuguesa - O Passado e o Futuro", edições Avante, 1976. Pois as "grandiosas concentrações de massas" de apoio a Vasco Gonçalves, ou, se se preferir, "as grandes mobilizações populares" de "contenção da ofensiva da reacção", convocadas pela Cintura Industrial de Lisboa, reúne, em 16-11-75, "no Terreiro do Paço cerca de 200 mil pessoas" e quatro dias depois "100 mil, em Belém" (pág. 167).


Também foram de 200 mil em Lisboa e de 100 mil no Porto, as manifestações que "partiram os dentes à reacção" no 28 de Setembro, e de 200 e 100 mil as celebrações da vitória sobre a intentona do 11 de Março, que, lembremos, conduz à nacionalização da banca pelo Conselho da Revolução a 13 de Março, no dia em que "o cérebro e a mão de ferro do capitalismo monopolista sofreram um golpe mortal" - Cunhal dixit.


Uma excepção, a manifestação de 14 de Janeiro de 1975 pela unicidade sindical reuniu "300 mil trabalhadores" (Cunhal, obra citada, pág. 89). Só para esmagar a concentração do PS, contra a mesma unicidade, que dois dias depois pôs o Pavilhão Carlos Lopes a deitar para fora!


Em suma, há 35 anos que é assim: são sempre 200 mil em Lisboa, excepcionalmente 300 mil, os comunistas do Bloco e do PCP só sabem contar em múltiplos de 100 mil, com as televisões, as rádios e os jornais (mais agora do que em 75, aliás) a contar e fazer crescer os múltiplos de cem mil. A falta que nos faz o exemplo de Espanha!

quinta-feira, 29 de outubro de 2009

Todos os caminhos vão dar a Marcelo

A Marcelo estendem-lhe a passadeira. Desta vez nem é preciso que Deus desça à Terra, a ele, Marcelo, ergue-se-lhe um caminho semeado de flores, serpenteando por cima dos mares, até ao Céu. Em verdade em verdade vos digo: Ele é o caminho, a verdade e a vida, do PSD.

No mesmo dia, praticamente à mesma hora, Paulo Rangel e José Luís Arnaut, finalmente, lançaram nas televisões a candidatura de Marcelo ao trono do PSD. Com oito dias de atraso, a bem dizer. Logo no primeiro dos seus sermões de domingo a seguir às autárquicas, Marcelo fizera-se lembrado bem ao seu estilo: Oferecia "cimeiras" a cada uma das personalidades, maneira de preparar a procissão que o viesse buscar num andor.

Não vieram logo e Marcelo zangou-se: "Se querem transformar isto num ringue (leia-se, se houver luta pela liderança), não contem comigo, assim não vou". Ninguém tinha reparado que houvesse luta, apenas vagas intenções, para depois, se a D. Manuela abandonar o barco.

Mas Marcelo tinha pressa e resolveu dramatizar. Não vou, não vou ─ disse no Gato Fedorento. Não vou, não vou, não vou ─ insistiu com Flor Pedroso. Genial! A birra de Marcelo desatou as línguas. Esta noite caíram sobre ele uma torrente de elogios.

"Marcelo é o maior, ele foi o melhor líder de Oposição que jamais houve neste País" ─ proclamou Paulo Rangel e não foi contrariado pela sua amável interlocutora, que bem lhe podia ter dito que a bondade de uma oposição se mede pela capacidade do líder ganhar as eleições seguintes, como fez Guterres, como fez Durão, como fez José Sócrates. Claro que ninguém na RTP pode contrariar Marcelo, ele é o padre-cura daquela paróquia, e se não lhe dão tudo o que quer, ele vai queixar-se à concorrência.

Ainda mais edificante foi a oração de Arnaut: "Só ele pode unir o Partido!". Mas o PSD está desunido? Onde, quando? O próprio Arnaut se desmentiu logo a seguir: "O PSD está tão unido que Aguiar-Branco foi eleito com 77 votos".

Os dados estão lançados. Marcelo quer união, que ninguém se lhe oponha, não gosta de contraditório. Por isso não quis ser eleito deputado, que se deu mal com a função quando por lá passou na Constituinte. Já então preferia, ele próprio confessou, "a criação de factos políticos", no Expresso, "tão amigos que nós éramos", não é verdade, Dr Balsemão?

Continua na mesma. Enquanto esperava que o carteiro passasse outra vez, para quê a tribuna de S. Bento se tinha um púlpito na RTP? Marcelo, grande Marcelo, o trabalho que lhe deu esta segunda oportunidade!

Chegou a hora/chegou chegou/ A hora é boa/ E o samba começou!

A Bíblia nunca se engana


A Bíblia, segundo os crentes, é para ser tomada a sério, não é uma obra de ficção, como pretendem alguns, e a maioria dos cristãos não faz segredo disso.
5. Cremos na inspiração divina e total das Escrituras Sagradas, na Sua suprema autoridade como única e suficiente regra em matéria de fé e de conduta e que não existe qualquer erro ou engano em tudo o que ela declara.
Pelo menos, no portal evangélico, aqueles cristãos chamam os bois pelos nomes: tudo é inspiração divina, a Bíblia não tem qualquer erro ou engano, é a suprema autoridade, em matéria de fé e de conduta. Os católicos, e os judeus, dizem isso e o contrário, quando lhes convém. Os primeiros, de qualquer maneira, não lêem a Bíblia, ficam muito admirados quando se lhes aponta algum extracto ipsis verbis, por exemplo, da livro de Josué. E também não vão ler o livro de Saramago, aliás bastante mais moderado do que as afirmações que o autor tem produzido.

quarta-feira, 28 de outubro de 2009

Cavaco acha-se Papa

E fala mais do que ele. Fala todos os dias. De cátedra. Ora quando o Papa Cavaco fala de cátedra é que se julga infalível. E como o Papa não admite contraditório.
Mesmo, e sobretudo, quando ninguém lhe encomendou o sermão.

Foi assim na tomada de posse do Governo com aquela teoria peregrina dos "défices gémeos", que só é dogma para os economistas liberais do século XIX: Cavaco pretende converter o Governo à sua ortodoxia económica, "ou crês ou morres"?

E foi assim hoje mesmo em Madrid a fixar como prioridade o aumento das exportações. Dogma ou ingerência? Pois não compete ao governo apresentar o seu programa à Assembleia, que o rejeitará ou não, e o Presidente tem o dever de não meter o nariz onde não é chamado?

O novo anúncio da Zon

sábado, 24 de outubro de 2009

Marcelo telefonou a Flor Pedroso

Esta noite, às cinco da manhã. Diz Marcelo:
─ Flor, amanhã, à 19H45, hem, além da perguntas que já combinámos, hem, assim lá para o fim, faça-me assim uma pergunta do género: viu o Gato Fedorento de sexta-feira?
─ Muito bem, professor, obrigada de me ter acordado.

E amanhã, às 19H45, adivinham o diálogo do genial comentarista com a sua entrevistadora de estimação?
Flor Pedroso: Professor, viu o Gato Fedorento de sexta-feira?
Professor: Não. Porque pergunta?
Flor Pedroso: Falaram de si, Professor.
Professor: Ah falaram? Não soube de nada.

O Professor é assim. O leitor se por acaso também não soube de nada, vá por mim, informe-se, aqui. Há três vídeos do último episódio, veja os três. É o melhor que alguma vez foi dito de Marcelo depois do vídeo do aborto.

quarta-feira, 21 de outubro de 2009

Em nome de Saramago: que mal fez a Deus o pobre do jumento?

O Sr. Mário David, eurodeputado do PSD e vice-presidente do grupo parlamentar do PPE, adorava que José Saramago renunciasse à nacionalidade portuguesa, de resto não pode fazer nada: não é dono do direito de ser português, não pode banir ninguém, felizmente para nós, a Inquisição acabou, Saramago não é António José da Silva, embora também seja escritor, não pode ser mandado queimar no Terreiro do Paço, que está em obras, não dá para se organizar lá um auto-de-fé.

Tem de ter paciência, Mário David, sabemos que é uma pessoa importante no PSD e no Parlamento Europeu, mas diga o que disser o Sr. Václav Klaus da Checoslováquia, o Parlamento Europeu em Portugal não manda nada, e o PSD de momento também não. Nem sequer pode anular, ou impedir, um qualquer prémio lhe seja, ou tenha sido, atribuído.

Não estou preocupado com o Sr. Mário David, e Saramago também não, ao que parece. Mas já fiquei absolutamente consternado com o que disse um tal Morujão, porta-voz da Conferência Episcopal, católica apostólica romana: Que Saramago revelava ignorância e a ignorância é muito atrevida.

É que essa expressão sobre a ignorância ser muito atrevida era, ipsis verbis, o que dizia o Padre José Augusto, padre da minha terra há quase 50 anos, quando alguém na paróquia murmurava, em voz muita baixa, alguma objecção remota à virtude de Salazar ou à santidade da guerra colonial, em defesa da civilização cristã e ocidental.

Nessa altura o Padre José Augusto frequentava o café da terra. Ria a bandeiras despregadas com as pilhérias do deputado da União Nacional João Amaral, a verberar aqueles que na Oposição lembravam os evangelhos ou os ensinamentos de João XXIII. "Com papas e bolos se apanham os tolos", dizia Amaral e repetia o Padre, canoro e belicoso, fulminando com o olhar quem parecia duvidar. E era vê-lo no púlpito, citando as pastorais do senhor Bispo de Lamego, as encíclicas dos bispos e do Papa, todos os mandamentos da Santa Madre Igreja. Todos os escritos da Igreja abençoavam Salazar, só os hereges é que não!

─ Sr abade, mas a Bíblia (o Novo Testamento) não diz que...
─ Cuidado, está a ser atrevido. E ignorante. "Sempre a ignorância é muito atrevida". Nem lhe respondo. Não vou gastar cera com ruim defunto.

Fim de papo. A Igreja portuguesa, reaccionária, salazarista, era assim há cinquenta anos lá na minha aldeia, na voz do Padre José Augusto. Pelos jeitos continua na mesma, na voz do porta-voz oficial da Conferência Episcopal. Eles é que sabem, os outros têm o direito de ouvir, a Santa Madre Igreja, e de se calar. Aquele senhor vice-presidente do PPE está pelos estes ajustes, sacrossantos.

Andei num semanário, estudei a Bíblia, a parte que me deixaram ler, com a leitura que dela faziam os frades capuchinhos, salvo erro. Só dezenas de anos depois, ao ler uma entrevista do Padre Felicidade Alves, soube do conteúdo do Livro de Josué, onde o tal Deus mau, vingativo, cruel, manda que os Exércitos de Israel massacrem populações inteiras, homens, mulheres e crianças, até os animais, incluindo o jumento.

O jumento, senhores, que mal tinha feito a Deus o pobre do jumento?


segunda-feira, 19 de outubro de 2009

Ponderar é preciso

José Saramago segundo o i
A Bíblia? "Um desastre", um livro repleto de "maus conselhos, incestos e matanças". E a Igreja Católica? "O sonho da Igreja é transformar todos em eunucos".
Luis Filipe Menezes segundo o i
Em toda a Europa há eleições, há um partido que ganha, não tem maioria absoluta, e depois apresenta um governo ou de coligação ou com um acordo parlamentar prévio para uma legislatura. Só em Portugal é que há esta bizarria em que alguém que ganha sozinho considera que os que estão ao lado são infrequentáveis e os que estão ao lado têm como única ambição destruir aqueles que ganharam eleições. Nós temos uma tendência para a asneira, para a tontice.

domingo, 18 de outubro de 2009

O Marcelo é um chico-esperto

Repararam na maneira como ele chamou estúpidos a todos os líderes da Oposição, menos a Portas, que tem medo dele, por terem falado com José Sócrates? Fácil. Bastou alterar um pouco os factos, dizer que Sócrates propôs a todos que se coligassem com ele, aos que são pelas nacionalizações e aos que são contra, grande aldrabão, esse Sócrates! E a Manuela, e o Jerónimo, e o Francisco, e em certa medida também o Paulo, "caíram na esparrela, a falta que eu faço à frente do PSD, para denunciar estas manigâncias!".

Pequeno pormenor: Sócrates, que se saiba, pelo menos ninguém o disse, não propôs coligações a ninguém". Perguntou a cada um se estava disponível a iniciar um diálogo, sem condições prévias, com vista a assegurar uma solução governativa estável para o País. Iniciar o diálogo, hem? Sem condições prévias? Género o que é que cada um acha importante que o PS transija? E o que é que acha pôr de seu? Com vista à estabilidade do País?

Logo alguns responderam que a estabilidade não interessava nada, pelo contrário. Deixando à vista que... a luta continua, o Sócrates para a rua, política é espectáculo e estamos aqui para isso.
E foram francos. Marcelo, não: para se fazer passar por inteligente, o único, o bom, o da Bayer, chamou burro a toda a gente.

Marcelo sempre foi assim, quando está sozinho em cena, sem contraditório, como naquelas pretensas entrevistas, na RTP. Lembro-me dele na Constituinte, foi discreto e reservado, absolutamente insignificante. Foi ministro dos Assuntos Parlamentares de Balsemão, passava a vida a convidar os jornalistas para o seu gabinete, fugia a sete pés de dizer o que pensava no plenário, podiam cair-lhe em cima e ele tem horror de apanhar.

Marcelo, para brilhar na sentença, já idealizada antes do julgamento, ajeita os factos provados às suas conveniências prévias. Conheci juízes assim. Brilhantes. E tenebrosos. Porque... "ajeitam os factos", e dos factos provados só excepcionalmente cabe recurso. É por isso que foge do contraditório como o diabo da cruz. Deus nos livre de nos calhar um juiz assim!

Com Marcelo não se pode falar a sério. Só pode ser desmascarado se se usar o mesmo método, simplista, sem se incomodar com a realidade dos factos, caricatural, a rir. O único que chegou para ele foi Ricardo Araújo Pereira, com aquelas palermices gloriosas, no debate sobre o aborto. Porque se recusou a falar a sério com ele. Vendo bem, até lhe respondeu na mesma moeda, que aquilo que Marcelo dizia não tinha ponta por onde se lhe pegasse.
Então como agora, Marcelo não se pode levar a sério, é um chico-esperto e não passa disso.

sexta-feira, 16 de outubro de 2009

Uma campanha alegre

Todos os partidos da Oposição ganharam as eleições de Setembro, não se podiam agora ir aliar à Situação, que foi punida, vendo bem só ela é que perdeu, em sufrágios e números de deputados, que importa isso de, apesar de tudo, ter tido mais votos, desde quando é que "ter mais do que os outros" é virtude, em Portugal?

A Situação não tem virtude e não é de fiar. Portou-se mal no passado, portar-se-á mal no futuro. Como é que ousa pedir namoro à gente, e para governar o quê?

─ Eu já te digo o que é governar!

Lembras-te como foi quando tinhas maioria no Parlamento mas minoria na rua, minoria nas televisões, minoria nas rádios e nos jornais? Agora vais ter minoria também no Parlamento. E ainda tens a lata de nos dizer: vamos dialogar?

─ Eu já te digo o que é dialogar!

Ainda o Governo não saiu da casca e já tem pela frente um campo de minas. A primeira delas: o PCP logo apresentou uma resolução para parar com a avaliação dos professores: "para testar a vontade de diálogo" ─ diz Bernardino a sério . O BE uma resolução para parar apresentou já: "para o diálogo provar" ─ ameaça Pureza a rir.

Aliás uma coisa dessas nem é preciso o PS votar a favor. Basta que as iniciativas do PCP e do BE tenham o acordo do PSD e do CDS, que o que mais querem da vida é... parar com a avaliação. Na tropa, no meu tempo, dizia-se: "ordinário, marche!" Aqui é mais: "ordinário, pare!

E tem contrapartidas, fáceis e deliciosas: na actual composição do Parlamento, para fazer avançar uma iniciativa do PSD e do CDS, e assim humilhar o Governo, o que dá gozo a todos, basta apenas que o PCP e o BE se abstenham. Amor com amor se paga.

Isto é: ninguém na Oposição quer governar com o PS, mas todos podem... fazer parar o que o PS governar. A morte deste Governo é uma questão anunciada.

Que nos partidos da Oposição são todos homens honoráveis e todos vão querer dar a sua facada a César no Senado. Para já, onde divergem um pouco, é no tempo e no modo de o fazer. Assim como naquele debate que contava o Eça na Campanha Alegre:
(...) tratava-se de decidir, a sangue frio, com argumentos e boa gramática ─ se os maridos deviam matar suas mulheres. O Sr. Dumas tinha dito com o charuto na boca, folheando a Bíblia ─ mata-a! Outros, fechando a navalha no bolso (que a tinham!) diziam generosamente: não a mates! Alguns vaudevillistas, entre uma bock e uma pilhéria ─ vai-a matando sempre! E outros acrescentavam, expondo que era necessário estudar mais a questão e consultar dicionários: por ora não a mates!
Nesta parábola, é evidente que a mulher adúltera é o Governo. O sr. Dumas é o Portas, está na cara. Os vaudevillistas são os do Bloco, uns artistas. Os outros, os outros... por ora não a mates, vamos estudar?! Só se for o Pacheco Pereira! E os que para já preferem guardar a faquinha no bolso? Gente generosa! Só mesmo o PCP.

quinta-feira, 15 de outubro de 2009

Desintegração da União Europeia ─ um cenário negro

Estamos em Janeiro de 2020, em Bruxelas o mal-estar é geral, desencadeado pela crise imobiliária com que a cidade se encontra confrontada: a União Europeia está a tentar vender ao desbarato milhares e milhares de metros quadrados de escritórios, agora sem uso, enquanto os últimos funcionários e políticos europeus abandonam a cidade colocando no mercado, que não consegue absorvê-los, alojamentos em série.

Mesmo o Berlaymont, símbolo do poder europeu e sede da Comissão, vai a leilão. Muitas empresas, que tinham vindo instalar-se em Bruxelas atraídas pela proximidade das instituições, estão a fazer as malas, o que contribui para afundar ainda mais a outrora orgulhosa capital da Europa, que de repente acordou deprimida e provinciana, no centro de um país que deixou de ter interesse. Há vários assim. A própria Europa deixou de contar.

O que se passou? Como foi que a União Europeia que parecia tão sólida pôde desintegrar-se assim tão facilmente? Para se entender bem tudo, é preciso recuarmos à crise bancária e económica de 2008 e de 2009, que transformou completamente o mundo ocidental. Foi uma crise que deixou o mercado interior e a moeda única, os dois pilares da União Europeia, gravemente maltratados.(...)

Depois, na Primavera de 2010, os conservadores regressam ao Poder no Reino Unido (...)

Este é o ponto de partida do cenário negro, o primeiro dos cenários que se colocam à União Europeia. Segundo Jean Quatremer, jornalista do Liberation, no seu blogue Nos corredores de Bruxelas. Vale a pena ler tudo.

quarta-feira, 14 de outubro de 2009

Apoiado, Eduardo Pitta, é exactamente como diz.

Justíssima esta análise de Eduardo Pitta, no blog Da Literatura, em especial a comparação que faz de Karl Rove, guru dos neocons americanos, com José Pacheco Pereira e Paulo Mota Pinto. O mesmo Karl Rove que continua praticamente todos os dias, na Fox News, a agitar as águas turvas do reaccionarismo americano, como Pacheco Pereira entre nós, a pregar contra o apocalipse que Barack Obama vai desencadear. A única diferença, apesar de tudo, é que Karl Rove conseguiu duas vitórias de George W Bush, Pacheco e Mota Pinto só enterraram o PSD. De resto, estou totalmente de acordo, estão bem uns para os outros. E enquanto forem os mesmos a mexer os cordelinhos no PSD, Sócrates pode dormir descansado. E começar a preparar as próximas eleições, daqui a seis meses, que nem Cavaco nem as Oposições o vão deixar governar. Uma síntese perfeita, este texto que aqui transcrevo, na íntegra e por extenso, com a devida vénia:

Terça-feira, Outubro 13, 2009

MUDAR DE KARL ROVE


Desde que foi eleito secretário-geral do Partido Socialista, em 24 de Setembro de 2004, José Sócrates tem sido acusado de tudo. Isso não o impediu de ganhar as legislativas de 2005 com maioria absoluta e as de 2009 com maioria relativa. Sublinhar que a vitória de há quinze dias foi obtida contra uma coligação negativa de sete corporações: sindicatos, magistrados, jornalistas, professores, médicos, farmacêuticos e militares. Anteontem, o PS ganhou as autárquicas, obtendo mais votos, mais mandatos e mais presidências de câmara do que nas autárquicas de 2005. Contra os 22,95% do PSD, o PS obteve 37,66%.

Lembrar aos distraídos que 28 câmaras do PSD foram conquistadas pelo PS: Leiria, Figueira da Foz, Trofa, Ourém, Castelo de Paiva, Barcelos, Terras de Bouro, Vieira do Minho, Alfândega da Fé, Miranda do Douro, Oliveira do Hospital, Penacova, Tavira, Vila do Bispo, Manteigas, Mêda, Mesão Frio, Castro Daire, Mangualde, Moimenta da Beira, Tabuaço, Vila Nova de Paiva, Valença, Povoação, St.ª Cruz da Graciosa, Velas, Vila Franca do Campo e Lajes do Pico (as últimas quatro nos Açores). E outras seis conquistadas ao PCP: Beja, Viana do Alentejo, Vila Viçosa, Marinha Grande, Monforte e Aljustrel.

Imaginem o que seria sem a rua em brasa, desemprego, Freeport, férias dos juízes, ASAE, novo aeroporto de Lisboa, avaliação de professores, affaire Independente, IVG, Cova da Beira, Estatuto dos Açores, leis fracturantes, TVI, projectos de maisons, pré-dissidência de Manuel Alegre, reforma da Segurança Social, Código do Trabalho contra a esquerda, processos a jornalistas, Belémgate, crise económica internacional, endividamento da população, Quimondas, fronda anti-TGV, axfixia democrática, etc. Ou muito me engano, ou o PSD vai ter de substituir os seus Karl Rove
.

terça-feira, 13 de outubro de 2009

Bicicletas, hortas e corredores verdes: "O Costa no Castelo"

Como estará a capital se António Costa cumprir as suas promessas? A cidade será invadida por pistas para bicicletas e corredores verdes, o Terreiro do Paço terá a cara lavada, processo que também deverá começar no Parque Mayer. Além disso, o Metro chegará ao Aeroporto e haverá mais hortas na cidade.
Do Diário de Notícias, um jornal que está cada vez melhor, avesso a fretes, denunciador de encomendas, que não esconde notícias na gaveta, nem dá cobertura às pulhices do jornalismo politicamente correcto, como ontem ficou provado nos prós & contras.

E não temos mais eleições nos próximos seis meses


A Pátria não é a terra; não é o bosque, o rio, o vale, a montanha, a árvore, a bonina: são-no os afectos que esses objectos nos recordam na história da vida....
Alexandre Herculano

Citação tirada da Corte na Aldeia, um blog que me apareceu em sonhos

segunda-feira, 12 de outubro de 2009

O que eu mais gostei nestas autárquicas

Do resultado do Bloco de Esquerda:
166.741 votos, isto é, 3,02% para as câmaras municipais. Concorreu a 133, ganhou 1. Cuja presidente já o era, quando aderiu ao Bloco de Esquerda.
Lembram-se dos 16-18% nas sondagens? ─ Foi há um mês!
Lembram-se dos quase 10%, quase 600 mil votos? ─ Foi há quinze dias!
E vão lembrar-se destes 3,02%, e 166.741 votos? ─ Foi ontem.

O PRD demorou dois anos a desinchar. O Bloco está a bater todos os recordes mundiais de rapidez de desinchamento.

Que tudo começou no debate Sócrates-Louçã. Foi há cinco semanas.
Melhor é impossível.

sábado, 10 de outubro de 2009

Ratificações(3): As palhaçadas do Senhor Klaus

O gesto é tudo. Este é Vaclav Klaus, presidente da República Checa, que há mais de dois anos goza com a União Europeia, inventando novos pretextos, praticamente todas as semanas, para não assinar o Tratado de Lisboa.

Apesar de todas as pantominices da triste figura, como quando foi ao Parlamento Europeu acusá-lo de ser uma espécie de assembleia da antiga União Soviética e de estar sempre de acordo com o "Governo" da União Eurpeia.

Apesar das asneiras jurídicas que tem debitado sobre o Tratado. Designadamente estas:
The democratically established authorities of our state will be deprived of the right to decide on many areas of public life and this administration will be turned over to the EU authorities, which are not subjected to sufficient democratic control. In addition, the European Union authorities will be allowed to expand their own competencies over life in our country and its citizens at their will, even without our consent.
Que Pacheco Pereira, admirador de Klaus, logo transcreveu para o seu blog. Ora acontece que, para começar, o novo Tratado, contrariamente ao que está, admite e prevê a possibilidade de um Estado membro sair da União Europeia. Eis o que, desde logo, devia tranquilizar os checos sobre a possibilidade de "os estrangeiros" lhes imporem algo que ofenda os seus princípios democráticos internos.

E sobretudo ninguém priva os checos de rejeitarem decisões não previstas no Tratado: têm de ser tomadas por unanimidade.

Nem de reagir ao processo simplificado de revisão, previsto no novo artigo 48º, o qual segundo Klaus "allows the establishing treaties of the EU to be changed and thus - immediately - also by a decision of the Council of the European Union". Precisamente porque o parágrafo 6º do mesmo artigo 48º dispõe que quaisquer alterações assim decididas só entram em vigor se e quando forem ratificadas por todos os Estados membros.

Todas as objecções de Klaus foram rebatidas em devido tempo, na República checa e por toda a Europa. Não evitaram que as duas Câmaras do Parlamento do seu país ratificassem o Tratado de Lisboa com maiorias claras:
  • a Câmara dos Deputados checos, a 18 de Fevereiro de 2009, com 125 votos a favor, 61 contra e 11 abstenções;
  • o Senado, a 6 de Maio de 2009, por 54 a favor, 20 contra e 5 abstenções.

Prova evidente do seu mau perder é o discurso que fez no próprio dia em que o Senado votou a ratificação do Tratado. Acusou os senadores que votaram a favor de terem "renunciado à sua integridade cívica e política". E logo incentivou os senadores derrotados a recorrerem, de novo, ao Tribunal Constitucional.

Estávamos a 6 de Maio. Mas só em 29 de Setembro quando se tornou público que o Povo irlandês aprovava o Tratado, e por maioria qualificada de dois terços, é que 17 senadores amigos do Presidente, quase todos os que tinham sido derrotados na votação de Maio, recorreram ao TC. Klaus logo declarou que só assinava quando o TC se pronunciasse. De novo. Pela enésima vez.

Agora inventou outra dificuldade. Que o novo Tratado permite aos herdeiros e descendentes dos alemães dos Sudetas, 3 milhões, que no fim da Guerra foram colectivamente responsabilizados pelos crimes de Hitler, colectivamente expulsos das terras onde viviam há centenas de anos, e vítimas do confisco generalizado de todos os seus bens, recorressem agora ao Tribunal Europeu, passando por cima dos tribunais checos, para obterem indemnizações.

As perseguições às minorias alemãs, e aos sobreviventes do Holocausto, para lá da cortina de ferro no pós-guerra foram de facto abjectas. E basta ler "a 25ª hora" de Virgil Georghiu ou as obras da recem premiada Herta Müller, uma alemã romena, dos Cárpatos. Mas o Tratado de Lisboa só prevê a possibilidade de recurso directo dos cidadãos aos Tribunais Europeus para situações derivadas da aplicação de novas leis europeias.

Vaclav Klaus enganou-se mais uma vez. E o que é pior revelou a sua verdadeira face: cúmplice dos crimes estalinistas praticados no seu país há mais de 60 anos. Klaus é uma vergonha. Não admira que seja tão adulado pela extrema esquerda e extrema direita portuguesas.

sexta-feira, 9 de outubro de 2009

Afinal havia escutas




Escutas em Belém.
Esta é a prova que faltava e que põe um ponto final no assunto.
Descoberta e publicada em primeira mão pelo Jumento.

Por um punhado de votos

4.736 votos, de fora da Europa, deram ao PSD dois deputados à Assembleia da República, num círculo com alegados 94.471 potenciais votantes ─ alguém acredita?

2.368 votos é quanto vale o deputado de fora da Europa José Cesário, um deles, secretário de Estado da Emigração no último Governo do PSD. E este número (estamos num sistema proporcional?), não pode deixar de ser comparado com os 10.001 de Garcia Pereira em Lisboa, que não deram para eleger um primeiro deputado para o PCTP/MRPP, ou com os 25.314 de Miranda Calha em Portalegre, onde 108.632 inscritos, e 66.122 votantes, que não dão direito a mais deputados do que os desinteressados (fictícios?) emigrantes portugueses nos Estados Unidos, Brasil ou África do Sul.

Está na Constituição? Está. Mas não devia estar. O recenseamento dos emigrantes é, globalmente, uma fraude, como sabem todos os portugueses que têm familiares na emigração e algum dia fizeram questão de perguntar como essas coisas se fazem.

Por vezes um único endereço recebe dezenas de envelopes. Quem os recolhe? Quem os reenvia? Ninguém está interessado em saber. Que "um punhado de votos", vindo de um HLM dos arreores de Paris (que provavelmente já só existe para quem recolhe os envelopes), ou de um ponto conveniente de uma comuna da Califórnia, ou de uma favela do Brasil (tudo pode servir, no sistema que temos) faz, pode fazer, toda a diferença.

Sabe-se que a imensa maioria dos envelopes, em países onde os correios funcionam (no Brasil, desta vez, muitos só chegaram três dias depois das eleições), são devolvidos à procedência porque os destinatários são desconhecidos naqueles endereços. Há cada vez menos porteiras condescendentes a tomar conta dos envelopes ─ é o que isto prova.

A última tentativa de moralizar o sistema, impondo o voto presencial nos consulados e embaixadas, soçobrou há meses, com um dos muitos vetos políticos do Presidente. Não há volta a dar-lhe. Só mesmo acabando com o desprestígio e a batota que é a eleição de deputados pela emigração.

Promova-se a ligação dos emigrantes às origens, permitindo-se-lhes que votem pelos deputados da sua terra, de preferência por voto presencial nos consulados e embaixadas, que temos. Obriga-se um emigrante a ir ao consulado? Qual é o problema? Assim obriga-se (a alguns deles apenas?) a ir aos correios e 92% dos "potenciais votantes" não põem lá os pés.

Ir ao consulado, encontrar os amigos, votar nas eleições portuguesas pode ser uma festa pra os emigrantes que gostam de Portugal. Assim a Constituição o permita!

quinta-feira, 8 de outubro de 2009

Parabéns, Itália, a esperança renasce

Que Berlusconi, aquele tipo foleiro, sem piada, tão parecido com o Mussolini, espécie de imperador romano decadente e organizador de bacanais, tenha perdido a imunidade dá um gozo enorme a muita gente. Como escreve António Di Pietro, o antigo juiz das "mãos limpas", no seu blog:
«Oggi è come se l'Italia avesse vinto i Mondiali di calcio. Almeno oggi, in questa notte del 7 ottobre 2009, gli italiani potranno sognare un'Italia diversa».
Como se a Itália tivesse ganho o Mundial? Eu diria mesmo mais: "Como se o Benfica tivesse ganho a Champions outra vez, depois de ter ganho a Liga, estamos à espera desde 1962". Partilho da sua alegria, Senador. A sucessiva reeleição de Berlusconi é desesperante. Pior só o Lech Kaczynski na Polónia, um Presidente de sacristia, ou Vaclav Klaus na Chéquia, um Presidente aldrabão e contumaz.

quarta-feira, 7 de outubro de 2009

Ratificações do Tratado de Lisboa (2) ─ como é, como foi

Dissemos que de uma maneira geral, as votações a favor do Tratado de Lisboa foram esmagadoras. E que, comparativamente, a aprovação do Tratado de Lisboa, em Portugal, onde Lisboa se situa (208 a 22), foi pouco entusiasta, a pior dos "países da coesão".

Hoje seria ainda pior com a subida em flecha do Bloco, que quer "bloquear" a União da Europa e entende-se muito bem porquê, com a consolidação da CDU, contra desde a primeira hora, nunca enganou ninguém, e com o regresso ao poder no PSD dos soberanistas, como Pacheco Pereira, amigo e seguidor de Vaclav Klaus, da República Checa, Lech Kaczynski, da Polónia, e David Cameron, do Reino Unido.

Com Manuela Ferreira Leite e Pacheco Pereira, nos lugares de Luís Filipe Menezes e Pedro Santana Lopes, é pouco provável que escapássemos ao referendo. E com a demagogia e as ideias curtas, que são timbre dos políticos anti-europeus, estaríamos agora a sair da crise, como a Irlanda, se entretanto Pacheco Pereira, o grande ideólogo do PSD, não tivesse convencido Cavaco a seguir os exemplos de Kaczynski, Klaus e Cameron.

De todos Cameron é o mais perigoso. Porque foi no Reino que a ratificação do Tratado de Lisboa obteve o seu pior (346 a 206 e 81 abstenções na Câmara dos Comuns, nos Lordes não houve contagem dos votos). E porque o Partido Conservador é declaradamente eurofóbico, neste momento tenta pressionar Kaczynsky e Klaus para que não assinem a ratificação, de maneira a que os conservadores consigam chegar ao poder antes de terminado o processo de ratificação dos 27.

David Cameron já anunciou que se isso acontecer pedirá a devolução dos instrumentos de ratificação depositados pelo Governo de Gordon Brown e promoverá um referendo. Para enterrar de vez o Tratado. Que os conservadores rejeitam com argumentos delirantes: "mil anos da História de Inglaterra que vão pelo cano abaixo". Leia o artigo todo, dê uma olhada pelo Daily Mail, pelo Daily Telegraph, pelo The Times, se pensa que estamos a exagerar. E tudo isto apesar de que tudo o que criticam não lhes ser aplicável porque foram objecto de cláusulas de exclusão.

Mesmo que o regresso ao poder dos conservadores já não vá a tempo de impedir a entrada em vigor do Tratado de Lisboa, vários conservadores, entre os quais Boris Johnson, presidente da Câmara de Londres, defendeu ainda há dois dias, na Convenção Anual dos no Conservadores reunida em Manchester, que os Conservadores promoveriam uma consulta popular sobre o Tratado de Lisboa, quando chegarem ao Poder e qualquer que seja o estado do processo.

O que é que os súbditos de Sua Majestade fazem na União Europeia – é o que não se entende. Felizmente que no Tratado fica agora prevista e regulamentada a saída da União. Será quando o Reino Unido quiser e não deixa saudades.

Em suma estamos todos neste momento à espera do que fará Kaczynski, da Polónia, mais papista do que o Papa, e Klaus, da República Checa, cuja campanha contra o Tratado conhece todos os dias novas peripécias. A ver se se decidem. A tempo de evitar a bomba atómica com que os britânicos nos ameaçam a todos. Com o perigo aqui tão perto, ainda há quem se preocupe com o poder nuclear do Irão.

Curiosidades da ratificação do Tratado de Lisboa (1)

Os processos de ratificação do Tratado de Lisboa são bem a medida do europeísmo dos Estados-membros. E sobretudo não me digam que os ricos, ou os grandes, são pelo Tratado de Lisboa, enquanto os pobres e os pequenos não o querem.

Grandes houve que votaram entusiasticamente o Tratado, praticamente por unanimidade, como a Itália (551 a 0, na Câmara dos Deputados, e 286 a 0, no Senado, 0 abstenções em ambas). Pois é: a Itália tem defeitos, a começar pelo seu Primeiro Ministro Berlusconi, só não é mal-agradecida.

Tem neofascistas e neocomunistas, eurocépticos e eurocomunistas, comunistas ortodoxos e comunistas convertidos à democracia burguesa, socialistas e democratas cristãos, radicais, nacionalistas, internacionalistas, separatistas e liberais. A Itália tem de tudo, só não tem caspa anti-europeia na cabeça. Agradece à Europa, sem complexos, toda a solidariedade que tem recebido dela desde o Tratado de Roma. Quer instituições renovadas e funcionais. Votou o Tratado de Lisboa sem o único voto contra.

A Itália é um grande País e o Tratado de Lisboa favorece os grandes? É o que dizem os antieuropeístas primários portugueses do nosso Bloco Comunista, mas não é verdade. Também há/houve pequenos Estados absolutamente pró-europeus e nada desconfiados, como Malta (65 a 0) e o Luxemburgo (47 a 1).

Idêntica maioria obteve o Tratado de Lisboa no Senado da Alemanha (65 a 0), onde estão representadas as 17 regiões, e onde os comunistas da antiga RDA, que obviamente se opõem à União Europeia, preferiam o Pacto de Varsóvia, ainda não conseguiram entrar.

De uma maneira geral, as votações a favor do Tratado de Lisboa foram esmagadoras ─ em Espanha (322 a 6, no Congresso, e 232 a 6, no Senado), na Roménia (387 a 1), na Estónia (91 a 1). Até mesmo na Irlanda, no segundo referendo, após longa reflexão, a semana passada: 67,1% a favor do Tratado de Lisboa, isto é mais de dois terços do sufrágio popular.

Em Portugal, o Tratado de Lisboa não mereceu mais do que uma aceitação mitigada (208 a 22), provavelmente porque a ele surgem associados os nomes de Sócrates e Barroso e porque sem a Europa teríamos sido presa fácil de todos os extremismos. Progredimos com a Europa, a Europa Connosco serviu-nos de protecção suplementar.

Os vencidos do PREC nunca hão-de perdoar. De facto, toda a extrema esquerda portuguesa, a mais numerosa e mais bem representada no parlamento nacional de toda a União Europeia (em alguma coisa havíamos de ser os primeiros!) esteve contra desde o primeiro dia: a 19 de Outubro de 2007.

Ainda não estava terminada a negociação na cimeira do Parque das Nações e todos os comunistas portugueses, os mais estalinistas tanto como os menos, já desciam à rua a clamar vingança. Obtiveram-na, em parte, dois anos depois, nas últimas eleições para o Parlamento Europeu.

Reforçaram-se nas legislativas. Têm boa imprensa. Amigos bem colocados em todas as televisões e rádios. O combate continua. Mas ou me engano muito ou os próximos tempos provarão que não vão a lado nenhum. Que não servem para nada. Nem os revolucionários portugueses nem os reaccionários polacos ou britânicos. Como veremos amanhã.

terça-feira, 6 de outubro de 2009

Para quem a "ética republicana" é uma batata

Depois do fiasco da "operação escutas" (e ninguém esqueça que continua em Belém ao serviço indeterminado do Presidente ─ será nos «serviços secretos? ─ o "mandatário", o homem que encomendou a coisa e disse estar ali "a pedido do Presidente") até dá comichões ouvir um Presidente, que se inventou um pretexto para não aparecer nos Paços do Concelho no dia da República, falar em "ética republicana". A ideia que ele tem da honra da República e da honra dos republicanos que fizeram o 5 de Outubro!

A ideia que ele tem? Só se for esta, que o Inimigo Público, mais uma vez, descobre e publica:

Cavaco Silva celebra altura em que Afonso Costa não vigiava Teófilo Braga
05 5e Outubro Por Vítor Elias
Cavaco Silva presidiu às comemorações dos 99 anos da implantação da República, salientando que este é o momento dos portugueses se unirem em torno dos ideais republicanos

“Nesta data, eu pergunto-me a mim mesmo: será que o Afonso Costa ouviria o que o presidente Teófilo Braga dizia no seu gabinete? E, se o fizesse, usaria um copo de água encostado à parede?”, afirmou Cavaco Silva, o homem que mais se interroga a si próprio desde o filósofo grego Sócrates. “E antes da implantação da República, o João Franco espiaria o palácio do rei D. Carlos? Eu pergunto-me: porque é que a galinha atravessa a estrada???”, concluiu o Presidente da República.
A ideia que Cavaco Silva tem da ética republicana está toda e por inteiro nesta evocação.

segunda-feira, 5 de outubro de 2009

Quando um Chefe do Estado apostou em renegados

Aconteceu na Grécia, em 1965, era Primeiro-Ministro Geórgios Papandréou, o avô, precisamente, do Geórgios Papandréou, que ontem ganhou as eleições na Grécia à frente do PASOK. Papandréou, Senior, fora um resistente à ocupação nazi, tinha sido preso e exilado, liderara o primeiro governo do pós-guerra, em 1945, após a ocupação da Grécia pelos fascistas italianos e pelos nazis alemães, em 1965 era pela terceira vez Primeiro-Ministro, depois de ter ganho as eleições gerais de 1963 ao conservador Constantino Caramanlis, tio do PM da Nova Democracia ontem derrotado.

O que aconteceu, em 1965, foi um pretenso escândalo, até hoje por esclarecer: a descoberta pela imprensa de direita de uma organização clandestina de jovens oficiais de esquerda que estariam dispostos a bater-se contra um eventual golpe de direita e aos quais aparecia ligado o nome de Andréas Papandréou, ministro e filho do então PM, que viria a ser PM, ele próprio, vinte anos mais tarde. Na Grécia todos os vinte anos há um Papandréou Primeiro-Ministro, de esquerda? Que alterna com um Caramánlis, Primeiro-Ministro conservador? Assim parece.

Em 1965, na Grécia, por azar, a possibilidade de um golpe de Estado militar da direita era pública e notória, como mais tarde contará o filme Z, de Costa-Gavras ─ acabavam de assassinar em Salónica o deputado Lambrakis, num complot que meteu milícias de extrema-direita, com a cumplicidade dos altos comandos da polícia e, ao que se diz, até hoje, do próprio Caramanlis, vencido nas eleições de 1963. Por isso, a existência de uma organização clandestina de oficiais do Exército, anti-golpistas, "ligados" ao filho do PM, enervou as chefias militares. Exigiu-se a demissão do ministro da Defesa. Que Papandréou aceitou.

Mas quando Geórgios Papandréou quis ser ele próprio o ministro da Defesa, acumulando com o lugar de PM, o jovem Rei Constantino, há um ano em funções, resolveu dar um ar da sua graça e opôs-se frontalmente. O impasse conduziu à demissão de Papandréou. E à tentativa de formação de Governo com personagens menores do partido do líder demitido (chamava-se então "União do Centro").

Cinco governos se sucederam, com "renegados", "apóstatas", do partido que acabava de ser escorraçado do Poder sem que o Rei tivesse tido a coragem de dissolver o Parlamento e convocar novas eleições. Assim como D. Carlos em 1906-1908, com a ditadura de João Franco, quando mandou fechar S. Bento e se esqueceu de convocar novas eleições.

Cinco Governos chumbados, todos, no Parlamento, que iam prolongando a agitação nas ruas e os confrontos. Foi o que ficou conhecido na Grécia como "a apostasia de 1965". E criou as condições para o golpe de Estado dos coronéis em 1967. O Reizinho que soltara contra Papandréou todos os demónios, de repente calou-se. Mas um ano depois fugiu para Roma e proclamou a sua oposição aos coronéis. Os quais de imediato extinguiram a Monarquia.

Quando em 74 os coronéis foram corridos e voltou a democracia, o Rei Constantino também quis reocupar o trono. Demasiado tarde. "Roma não paga a traidores", o Povo grego, em referendo, desta vez, votou o fim da Monarquia. E o primeiro Presidente da República eleito foi o juiz que em 1964 tenha instruído o caso Lambrakis e inculpado pelo assassinato alguns altos quadros da Polícia e do Exército. Como se conta no Z, um filme a ver e rever, com Jean Louis Trintignant, no papel do juiz, Yves Montand, como Lambrakis. Um dos dez melhores que vi na minha vida.

Constantino, como D. Carlos, os reis, e alguns chefes de Estado que pensam como reis, não se conformam com o voto popular. A criação de cisões nos partidos existentes é uma tentação frequente. Para alguns chefes de Estado que pensam como reis.

Digo eu neste 5 de Outubro, dia da República, proclamada há 99 anos da varanda dos Paços do Concelho de Lisboa. Onde todos os Presidentes da República, democraticamente eleitos, faziam questão em ir num dia assim. Até hoje.

sábado, 3 de outubro de 2009

Os irlandeses são uns pândegos



À segunda foi de vez: 67,1 % a favor do Tratado de Lisboa e assim aumentaram as suas perspectivas europeias. Para quem tinha tantas dúvidas há cerca de ano e meio, este resultado é obra! E não me digam que agora lhes foram dadas garantias que antes não estavam no Tratado ─ é mentira.
Os irlandeses são uns pândegos:
deram um contributo de todo o tamanho para a crise que rebentou na Europa e no Mundo.
Agora com as próprias barbas a arder dão à reforma das instituições e à nova carta de direitos fundamentais europeus uma maioria de dois terços.
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Ainda falta a República Checa, de Vaclav Klaus, guia espiritual do Dr Pacheco Pereira,
que também queria em Portugal um referendo como na Irlanda
que até inverteu as setas do PSD quando Luis Filipe Menezes foi contra o referendo
que como na Irlanda nos teria feito passar a vergonha de arrastar na lama um Tratado
que até tem Lisboa no nome
que aqui foi acertado sendo José Sócrates presidente do Conselho de Ministros da UE
e sendo José Manuel Barroso presidente da Comissão
em dia de manifestação anti-europeia e anti-governamental do PCP e do Bloco de Esquerda.
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Para que conste.

quinta-feira, 1 de outubro de 2009

E ela: “porque os contei – um, dois"

Cavaco confuso

September 30th, 2009

Estava eu sentadinho na minha casa do Algarve, já com as pantufinhas calçadas e uma mantinha sobre os joelhos, a estudar os decretos-lei que o malvado do Sócrates me obrigou a levar para férias, quando apareceu a minha Maria, a dizer:

- Estão lá fora duas pessoas importantes do PS a dizer que tu estás a ajudar o PSD a elaborar o programa do Governo.

- E como sabes tu que elas são duas pessoas importantes do PS? – perguntei.

E ela: “porque os contei – um, dois -, porque são altos e porque trazem rosas ao peito.

Percebi automaticamente que o PS me queria manipular, encostando-me ao PSD, para disso tirar dividendos eleitorais.

Regressei a correr a Lisboa e, mal entrei no meu gabinete da Presidência da República achei que alguém me tinha mexido no computador porque o naperon que a Maria tinha posto por cima da impressora, por causa do pó, estava um bocadinho desviado.

Liguei o computador e fui ver os mails e achei-os um pouco vulneráveis. De tal maneira, que hoje mesmo liguei para a Zon e já cá veio um brasileiro que me configurou o meu programa de mails, de modo a só receber mails de pessoas decentes.

Por isso, portugueses, sou forçado – repito: sou forçado – a tornar pública a minha indignação e repetir que ninguém está autorizado a falar em meu nome, nem mesmo a minha mulher.

Se algum dia ela vier a público dizer que eu estou desmemoriado ou confuso, ou baralhado, ou confuso outra vez, podem ter a certeza que falará em seu nome pessoal porque, em meu nome, ninguém fala, a não ser o chefe da Casa Civil e o chefe da Casa Militar e, talvez, eu próprio, embora não tenha bem a certeza disso.

Boa noite e agora vou para dentro, pensar como raio é que vou arranjar uma maneira de não indigitar Sócrates como primeiro-ministro

(in o coiso, via coices do Jumento que levanta a ponta do véu)