sexta-feira, 24 de julho de 2009

Goodbye, Manuel Alegre

Meu amigo partiu. Meu amigo não volta.
Meu amigo dizia (estou a ouvi-lo)
vou procurar a minha estrela. Foi
e não voltou. Meu amigo (dizem)
tem agora o tamanho duma estrela.

Pois tenho estado a folhear os livros de Manuel Alegre, a reler os seus poemas dos primórdios, desde "As Rosas Vermelhas - Nasci em Maio, o mês das rosas, diz-se". E desculpem o mau gosto de reproduzir aqui aqueles versos seus ao amigo perdido em Nambuangongo. Alegre, o meu amigo, não morreu, nem vai morrer tão cedo, que já esteve do outro lado e voltou.

Lembro-me de lhe ter telefonado para Águeda, estava ele em convalescença, depois do Fausto Correia ter verificado que ele já podia falar com jornalistas: "Manuel, pois que estiveste morto uma data de horas e a morte não quis nada contigo e mandou-te de volta, conta-nos como é o outro lado!".

"Pois também eu gostava de saber, não me lembro de nada". E contou-me que se lembrava perfeitamente de ter começado a sentir-se mal no funeral de um amigo e de ter acordado muitas horas depois no Hospital com uma data de tipos aos berros. De mais nada.

Concordámos que deve ter sido uma situação parecida com a do Warren Beatty n'O Céu Pode Esperar. Calculo o escarcéu que Alegre terá feito por lá com o funcionário do Além a tentar metê-lo no avião com destino desconhecido e ele a resistir: "A mim ninguém me leva, a mim ninguém me cala". Os tipos que andam em cima das nuvens a arrebanhar as pessoas não tiveram outro remédio se não -lo de novo no sítio onde o tinham apanhado, que era a sua "Coimbra Nunca Vista".

Eis a razão por que Alegre é eterno, fica por cá o tempo que quiser. Na política é que não: Alegre acabou! Ao ter saído do Parlamento, não entrou para a "reserva da República", como Malraux disse de Pompidou, despedido por De Gaulle em Julho de 1968, e que menos de um ano depois, em Junho de 1969, reentrava na política pela porta grande, novo Presidente da República eleito, contra ventos e marés.

A grande diferença entre Pompidou e Alegre é, antes de mais, que o primeiro gostava do poder e que Alegre é um diletante. Todo o sistema em Portugal está feito para que não haja nunca nenhum poder que possa fazer o que quer e responder por isso (com a excepção do poder de Cavaco nos seus 10 anos como PM porque queria muito e tinha pela frente um Presidente bonacheirão). Em Portugal os poderes anulam-se todos, bloqueiam-se uns a outros, os portugueses não gostam de quem acelere mas de quem trave, a modorra permanente é que é a arte de ser português?

Talvez. Mas mesmo assim a vez de Alegre passou e não vai voltar. Primeiro porque o próximo Primeiro Ministro de facto vai ser o próprio Cavaco Silva por pessoa interposta. Que ninguém vai ter maioria, Alegre fez por isso, e o PS profundo, não falo dos líderes, não lhe vai perdoar.

Vamos entrar numa fase em que ninguém governa nem deixa governar. Cavaco Silva alinhou com os activistas do Ministério Público contra Sócrates, com os interesses instalados dos médicos contra Correia de Campos, com as arruaças dos professores, com a contestação dos seus amigos nos negócios, na imprensa e sobretudo nas televisões, com os reaccionários de todos os quadrantes que motivaram os seus vetos e irritações. Ganhou a primeira batalha.

Mas o que vem aí é uma guerra. Cavaco semeou ventos e vai recolher tempestades. Para combater Cavaco a esquerda precisa de um líder sólido. Que quando caírem os resultados em 27 de Setembro deixará de ser José Sócrates. Mas também não será Manuel Alegre, nem tão pouco Francisco Louçã, nem muito menos Jerónimo de Sousa. Não estamos na América Latina, nem na antiga Europa de Leste.

Não será Manuel Alegre o próximo candidato do PS às presidenciais. Por isso eu digo que o meu amigo partiu, o meu amigo não volta. Mas este post já vai longo amanhã voltarei ao assunto.

2 comentários:

  1. De facto, Manuel Alegre podia ter saído pela porta grande. Aqueles que votamos contra Mário Soares, mas principalmente, contra Cavaco Silva temos alguma culpa. É a vida...

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  2. Podia e não saiu: de facto "saiu pela esquerda baixa"... e não ganhou nada com isso. A não ser mais tempo de antena, coisa que nunca lhe faltou, ele tem boa voz. Mais quanto mais agita as águas mais se afasta da terra firme onde o seu povo, o povo anónimo do PS, vê com alívio o seu afastamento.

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