sábado, 15 de agosto de 2009

O que me chateia no PSD

Ui tanta coisa! Mas antes de mais uma autocrítica: o que o PSD é hoje também é minha culpa que uma vez votei neles e disse-o publicamente. Aconteceu a 19 de Julho de 1987, depois de o PRD ter feito cair o Governo minoritário de Cavaco Silva, facto que o Presidente Mário Soares aproveitou para dissolver o Parlamento e convocar novas eleições.

Quem não se lembra da primeira maioria absoluta de Cavaco Silva? O que poucos recordam é do que tinha feito o Governo para merecer a moção de censura do PRD que o abateu. Muito simplesmente: tinha-se oposto à viagem oficial à Estónia, então um Estado da União Soviética, de uma delegação oficial do Parlamento português.

Lembro-me de todo o episódio porque nessa altura passava, praticamente, os dias em S. Bento, onde fazia normalmente a cobertura dos trabalhos parlamentares para a RTP e, nas horas vagas, para o Semanário.

Lembro-me como tudo começou, uns meses antes, com uma visita oficial dos estónios a Portugal. O sr. Pires, honrado militante do PCP e eficiente chefe do gabinete de imprensa da Assembleia, andava numa excitação:

- Está cá o Presidente do Parlamento da Estónia! – alertava ele os jornalistas.

- Eles têm disso? Um Parlamento, na Estónia?! – brinquei com ele.

Eu tinha escrito, no Semanário, vários artigos sobre o Pacto germano-soviético de 1939, as posições que então tinha tomado Álvaro Cunha, no Diabo, e algumas consequências directas e indirectas do dito Pacto: a partilha da Polónia, a guerra feita à Finlândia e a ocupação dos Estados Bálticos pelo exército vermelho, mancomunado com os hitlerianos. Tinha a perfeita noção de que não havia qualquer autonomia dos Estados Bálticos em relação à URSS. Achei que a recepção feita aos estónios num parlamento da Europa Ocidental cheirava a esturro. Mas tinha mais que fazer.

Não liguei eu e suponho que não ligou nenhum jornalista em S. Bento à visita do Presidente, soviético, da Estónia ocupada. Meses depois, porém, uma nutrida delegação parlamentar portuguesa, ao mais alto nível, partia para Talin, via Moscovo. E um colega, salvo erro do Diário de Notícias, assinala que nenhum parlamento democrático jamais empreendera uma tal visita oficial àquele Estado soviético. Mais: a ocupação dos Estados Bálticos pela URSS nunca fora reconhecida por qualquer País da NATO.

O MNE caiu em si e mandou à pressa telegramas à delegação parlamentar a anunciar que o Governo se opunha à continuação da visita e defendia o regresso imediato à Pátria dos parlamentares portugueses.

Estes ficaram fulos, e no regresso contaram em detalhe as vergonhas por que tinham passado, disseram cobras e lagartos da atitude desrespeitosa do Governo em relação ao Parlamento, de que dependia, e não o contrário. Fernando Amaral, do PSD, Presidente do Parlamento e da delegação, era um dos ofendidos.

O PRD não se ficou pelos protestos: apresentou uma moção de censura. E fez cair o Governo, que não tinha maioria. Achei, e escrevi, que o Governo tinha tido razão e o Parlamento não. Assisti depois incrédulo à tentativa de “vender”a Soares um governo PS+PRD+PCP. Soares preferiu dissolver.

E nas eleições seguintes o PSD de Cavaco, que, contrariamente a todos os outros, tivera uma atitude responsável numa grande questão da política internacional teve o meu voto. E o de muitos outros portugueses: foi o primeiro governo de maioria absoluta de um só partido, o primeiro a durar quatro anos depois do 25 de Abril, globalmente um bom governo, estávamos precisados disso. Foi há 22 anos, e se fosse hoje voltaria a fazer o mesmo. Naquelas circunstâncias.

Em 1987, o PSD revelou-se um partido de carácter. Hoje, pelo contrário. Repararam na duplicidade, a tendência para ser falso, -- mendacity, dizia o Big Dad, naquela peça de Tenessee Williams -– que foi votar a favor do Estatuto dos Açores enquanto pensou que isso dava votos? E na maneira como se portou a seguir quando a voz do dono se fez ouvir com espalhafato (em vez de ter exercido serenamente os seus poderes todos de uma vez) prolongando a guerrilha por motivos fúteis e por tempo indeterminado? Pois teve a falta de carácter de não votar contra na Assembleia, para a seguir se prestar ao frete servil de ir fazer queixinhas ao TC, cujas tendências lhe eram conhecidas.

Tudo para que no fim da jornada ganhasse o Grande Chefe, o qual ao fazer durar a guerrilha quando tinha a faca e o queijo na mão para lhe pôr cobro desde a primeira hora, bem podia ser acusado de abuso... de posição dominante.

Portou-se mal o PSD, em minha opinião. Faltou-lhe lisura, soltou um fedor de falsidade. E isso, como dizia o almirante Pinheiro de Azevedo, “a mim, chateia-me”. E é só a primeira coisa que me chateia no PSD.

Sem comentários:

Enviar um comentário